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Empresas em situação económica difícil. Como sair da crise?

 

Como recuperar uma empresa em situação económica difícil ou insolvência iminente:

O facto de uma empresa se encontrar em situação económica difícil ou insolvência iminente não significa, necessariamente, que tenha de declarar insolvência.

O ordenamento jurídico português avança com dois regimes para fazer face a estas situações: o Regime Extrajudicial de Recuperação de Empresas (RERE) e o Plano Especial de Revitalização (PER), este último de natureza judicial.

A fim de apontar as diferenças entre ambos os institutos e as situações em que cada um se torna mais eficaz do que o outro, procuraremos, em seguida, responder a algumas questões que julgamos esclarecedoras.

 

  1. Regime Extrajudicial de Recuperação de Empresas (RERE)

 

  1. O que é o RERE?

Regime Extrajudicial de Recuperação de Empresas (RERE) é um instrumento através do qual uma empresa, que se encontre em situação económica difícil ou de insolvência iminente, enceta negociações com um ou mais dos seus credores, de modo a  alcançar, expressa e unanimemente, um acordo voluntário, de conteúdo livre e, por regra, confidencial, tendente à recuperação empresarial, com vista à sua viabilização e manutenção da atividade.

  1. O que se entende por acordo de reestruturação?

O acordo de reestruturação tem em vista a alteração da composição, das condições ou da estrutura do ativo ou do passivo de um devedor, ou de qualquer outra parte da estrutura de capital do devedor, incluindo o capital social, ou uma combinação destes elementos, incluindo a venda de ativos ou de partes de atividade, com o objetivo de permitir que a empresa sobreviva na totalidade ou em parte.

  1. Quando foi criado e entrou em vigor o RERE?

O RERE foi criado com a publicação da Lei nº 8/2018, de 2 de março e entrou em vigor no dia 3 de março de 2018.

  1. Que implicação teve a publicação do RERE relativamente ao SIREVE?

Com a entrada em vigor do RERE, o SIREVE (Sistema de Recuperação de Empresas por Via Extrajudicial), aprovado pelo Decreto-Lei nº 178/2012 de 3 de agosto, foi revogado. Os processos SIREVE submetidos até àquela data e que estivessem em curso, poderiam ser concluídos ao abrigo do regime em que foram desencadeados (artigos 35º e 36º).

 

  1. Quem pode recorrer ao RERE?

Podem recorrer ao RERE, as entidades devedoras referidas nas alíneas a) a h), do nº1, do artº 2º do CIRE, com exceção das pessoas singulares que não sejam titulares de empresa, a saber:

  • Quaisquer pessoas singulares ou coletivas;
  • A herança jacente;
  • As associações sem personalidade jurídica e as comissões especiais;
  • As sociedades civis;
  • As sociedades comerciais e as sociedades civis sob a forma comercial até à data do registo definitivo do contrato pelo qual se constituem;
  • As cooperativas, antes do registo da sua constituição;
  • O estabelecimento individual de responsabilidade limitada;
  • Quaisquer outros patrimónios autónomos.

Para estes efeitos, o conceito de empresa é definido conforme o disposto no artº 5º do CIRE: “toda a organização de capital e de trabalho destinada ao exercício de qualquer atividade económica”.

Cumulativamente, as entidades devem estar em situação económica difícil ou em situação de insolvência iminente (quando não consigam cumprir pontualmente as suas obrigações, designadamente por falta de liquidez ou por não conseguirem obter crédito – art. 3º e art 17º-B do CIRE) – art. 3º, nº 1, da Lei nº 8/2018.

  1. Além das pessoas singulares que não sejam titulares de empresa existem exclusões de outros devedores?

Sim. Não pode recorrer ao RERE o devedor que seja uma entidade referida no nº2 do art. 2º do CIRE, (art. 3º, nº 2 da Lei nº 8/2018), ou seja, as pessoas coletivas públicas e as entidades públicas empresariais, bem como as empresas de seguros, as instituições de crédito, as sociedades financeiras, as empresas de investimento que prestem serviços que impliquem a detenção de fundos ou de valores mobiliários de terceiros e os organismos de investimento coletivo, na medida em que a sujeição a processo de insolvência seja incompatível com os regimes especiais previstos para tais entidades.

  1. Quem são os credores no âmbito do RERE?

São credores, no âmbito do RERE, os titulares de créditos de natureza patrimonial, vencidos, vincendos e sob condição (art. 50º, nº1, do CIRE), qualquer que seja a sua nacionalidade ou domicílio.

Na medida do que seja necessário, os titulares de garantias sobre bens do devedor podem prestar consentimento relativo à alteração dos termos e condições da garantia, podem intervir nas negociações e no acordo de reestruturação, mesmo não sendo credores do devedor.

Podem ainda ser admitidos a intervir nas negociações e no acordo de reestruturação os sócios do devedor, na medida em que, em virtude da lei ou dos estatutos do devedor, seja necessária a sua intervenção ou o seu consentimento.

Finalmente, para efeitos do acordo de reestruturação, admite-se que grupos de credores sejam representados coletivamente por entidade que esteja mandatada por estes, no caso dos trabalhadores, as organizações representativas dos trabalhadores, para atuar como agente de financiamento e que grupos de beneficiários de garantias sobre bens do devedor sejam representados coletivamente por entidade que esteja mandatada por estes para atuar como agente de garantias (art. 3º, nºs 4, 5 e 6. da Lei nº8/2018).

  1. O RERE tem natureza imperativa?

Não. O RERE tem natureza voluntária sendo as partes livres de se sujeitar ao mesmo. A participação nas negociações e no acordo de restruturação é livre, exceto se forem credores do devedor a AT, a Segurança Social, trabalhadores e organizações representativas de trabalhadores, situações nas quais participam obrigatoriamente nas negociações a realizar no âmbito do RERE, mesmo que não subscrevem o protocolo de negociação, sem prejuízo do disposto no art. 30º da LGT (art. 4º, nº 3 e art. 14º da Lei 8/2018).

  1. O RERE é um procedimento universal?

Não necessariamente. A participação nas negociações é livre, podendo o devedor convocar todos ou apenas alguns dos credores. Deverá convocar aqueles que considere mais apropriados para alcançar o acordo de reestruturação e a sua desejada viabilização, sem prejuízo de no decorrer das negociações qualquer credor poder aderir ao protocolo de negociação de forma integral – adesões não parciais nem sujeitas a condição (art. 4º, nº 2 e art. 7º, nºs 5 e 6 da Lei nº 8/2018).

  1. Como é que se inicia a negociação de um acordo no âmbito do RERE?

A negociação de um acordo no âmbito do RERE inicia-se com a assinatura de protocolo de negociação entre devedor e credor(es), devendo os credores subscritores representar, pelo menos, 15% do passivo do devedor, que seja considerado não subordinado nos termos do CIRE e promover o seu depósito na Conservatória do Registo Comercial (CRC). O depósito do protocolo de negociação, do protocolo de alteração e das declarações de adesão podem ser feitos a todo o tempo, por qualquer interessado (art. 6º, da Lei nº 8/2018).

  1. O conteúdo do protocolo de negociação é livre?

O conteúdo do protocolo de negociação é estabelecido livremente entre as partes. Contudo, deve conter, pelo menos, os elementos referidos nas alíneas a) a f) do nº 1 do art. 7º, da Lei nº 8/2018 e os documentos referidos nas alíneas a) a e), nº 3 do mesmo preceito. Incluem-se nos elementos a apresentar: uma declaração de contabilista certificado (CC) ou Revisor Oficial de Contas (ROC), emitida há menos de 30 dias, que verifique o requisito de que os credores subscritores do protocolo de negociação representam 15% do passivo não subordinado do devedor e que os referidos credores subscritores são detentores de créditos não subordinados.

  1. Há outros documentos ou elementos que podem acompanhar a protocolo de negociação?

Sim. Podem ser aditados, nomeadamente, os elementos referidos nos nºs 2 e 4 do art. 7º, da Lei nº 8/2018.

  1. Qual é a duração das negociações?

O prazo máximo das negociações é de 3 meses, incluindo a prorrogação que as partes acordem, contados desde a data em for requerido o depósito do protocolo de negociação na CRC.

  1. Qualquer credor pode aderir ao protocolo de negociação?

Enquanto decorrerem as negociações, qualquer credor pode, a todo o tempo, aderir ao protocolo de negociação, através de uma declaração de adesão.

Apenas se admitem adesões integrais ao protocolo de negociação, considerando-se não escritas as adesões parciais ou sujeitas a condição, bem como as adesões que incidam apenas sobre parte dos créditos que o credor detém sobre o devedor.

  1. O protocolo de negociação pode ser alterado?

O protocolo só pode ser alterado através de protocolo de alterações e requer o consentimento expresso de todas as partes que o subscreveram inicialmente e das que ulteriormente tenham aderido (art. 7º, nº 7, da Lei nº 8/2018).

  1. As negociações e o protocolo de negociação são confidenciais?

Sim. O princípio instituído é o da confidencialidade, exceto se as partes acordarem, por unanimidade, em dar-lhes publicidade, no todo ou em parte. (art. 8º, da Lei nº 8/2018).

  1. Há derrogações especiais do princípio da confidencialidade?

Sim. A Segurança Social, a AT e os trabalhadores são, obrigatoriamente, informados do depósito do protocolo de negociação e do seu conteúdo, sempre que sejam titulares de créditos sobre o devedor. O incumprimento do dever de informação importa a nulidade do protocolo de negociação, bem como de todos os atos a ele inerentes (art. 8º, nºs 6 e 7, da Lei nº 8/2018). Alem disso, a AT pode aceder aos documentos, para efeitos de verificação dos pressupostos necessários à atribuição dos benefícios fiscais, previstos nos artigos 268º a 270º do CIRE (art. 8º, nº 5, da Lei nº 8/2018).

  1. Quais os efeitos do depósito do protocolo de negociação na CRC?

O depósito do protocolo de negociação na CRC marca o início das negociações propriamente ditas e o início da contagem do prazo máximo de 3 meses para conclusão das negociações. Além disso, determina um conjunto de obrigações específicas para o devedor e credores (artigos 9º e 10º, da Lei nº 8/2018), determina regras quanto à suspensão de processos judiciais (art. 11º), quanto a relações com “prestadores de serviços essenciais” (art. 12º) e, quanto à contagem de prazos para a apresentação à insolvência caso o devedor fique insolvente, nos termos do CIRE, após o depósito do protocolo de negociação (art. 13º).

  1. Quais os efeitos processuais decorrentes deste instituto?

A participação no protocolo de negociação ou a adesão a este por credor que tenha requerido a insolvência do devedor, determina a imediata suspensão do processo de insolvência, caso esta não tenha ainda sido declarada.

Além do mais, celebrado acordo, e salvo quando o mesmo preveja a manutenção da respetiva suspensão, extinguem-se automaticamente as ações executivas para pagamento de quantia certa instauradas contra a empresa e ou os seus respetivos garantes relativamente às operações garantidas, e, salvo transação, mantêm-se suspensas, por prejudicialidade, as ações destinadas a exigir o cumprimento de ações pecuniárias instauradas contra a empresa e ou os seus respetivos garantes relativamente às operações garantidas.

Tal não se aplica às ações executivas para pagamento de quantia certa ou quaisquer outras ações destinadas a exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias, instauradas por credores que não tenham subscrito o acordo.

  1. Como funciona o caso específico dos prestadores de serviços essenciais?

Com o depósito do protocolo de negociação na CRC, os prestadores de serviços essenciais ficam impedidos de interromper o fornecimento dos mesmos por dívidas relativas a serviços prestados em momento anterior ao depósito. São abrangidos:

  • Serviço de fornecimento de água;
  • Serviço de fornecimento de energia elétrica;
  • Serviço de fornecimento de gás natural e gases de petróleo liquefeitos canalizados;
  • Serviços de comunicações eletrónicas;
  • Serviços postais;
  • Serviço de recolha e tratamento de águas residuais;
  • Serviços de gestão de resíduos sólidos urbanos.

Tal não afeta os créditos dos fornecedores de serviços constituídos à data do depósito e vigora pelo prazo máximo de 3 meses, exceto se os prestadores forem parte do protocolo de negociação e acordarem prazo mais longo. Se o devedor não efetuar o pagamento pontual do custo dos serviços que sejam prestados após o depósito do protocolo de negociação na CRC, os custos decorrentes da obrigatoriedade de fornecimento (posteriores ao depósito do protocolo), que não sejam pagos pelo devedor, constituirão dívida da massa insolvente. Caso o devedor seja declarado insolvente no prazo de dois anos após o depósito do protocolo e, nos demais casos, beneficia de privilégio mobiliário geral, graduado antes do privilégio mobiliário geral concedido aos trabalhadores (art. 12º, da Lei nº 8/2018).

 

  1. Quem são os intervenientes nas negociações?

Para além do devedor e do(s) credor(es), o devedor, caso não o tenha feito antes, poderá solicitar, no decurso das negociações, a nomeação de um mediador de recuperação de empresas, nos termos do respetivo regime jurídico. Os credores podem, também, designar um credor líder, assessores financeiros e legais, ou acordar na nomeação de um comité de credores para acompanhar o devedor (artigos 14º e 15º, da Lei nº 8/2018).

  1. Quem é o Mediador de Recuperação de Empresas (MRE)?

O RERE institui a figura do Mediador de Recuperação de Empresas com o objetivo de facilitar as negociações entre devedor e credor(es). A intervenção do mediador depende sempre da iniciativa da empresa devedora, que poderá requerer a sua nomeação ao IAPMEI em qualquer fase do processo de negociação (mesmo após o depósito do protocolo na CRC). O IAPMEI procederá à nomeação, com base nas listas publicadas no seu sítio na internet, uma por cada Centro de Apoio Empresarial e por ordem sequencial, atento o disposto no Estatuto do MRE, aprovado através da Lei nº 6/2018, de 22 de fevereiro. [A cujo tema dedicamos um artigo.]

  1. O que é o diagnóstico económico-financeiro?

No decurso das negociações, o devedor, em articulação com o credor líder, os assessores financeiros e legais, se existirem, e o MRE, se houver sido nomeado, devem elaborar e apresentar aos credores participantes nas negociações, de forma transparente, o diagnóstico económico-financeiro do devedor que lhes permita conhecer os pressupostos nos quais pode basear-se o acordo de reestruturação. Para o efeito, o devedor pode recorrer à ferramenta de autodiagnóstico disponibilizada no sítio na Internet do IAPMEI – Agência para a Competitividade e Inovação, I. P.

  1. Quando encerram as negociações?

As negociações encerram com o depósito do acordo de reestruturação na CRC ou com o depósito de declaração de que não existem condições para prosseguir com as negociações (alíneas a) e b), nº 1, do art. 16, da Lei nº 8/2018). Não tendo havido depósito do acordo de reestruturação, encerram decorrido o prazo previsto no protocolo de negociação ou na sua extensão caso tenha existido acordo, ou decorrido o prazo máximo regulamentar de 3 meses (alínea c), nº 1, do art. 16º). O prazo previsto no protocolo pode ser prorrogado existindo acordo, mas respeitando sempre os 3 meses como máximo (art. 6º, nº 5, da Lei nº 8/2018).

Se no decurso das negociações o devedor ficar insolvente, o prazo não é suscetível de prorrogação. Além disso, se o devedor se apresentar à insolvência ou esta for declarada em processo de insolvência requerido por um credor, as negociações encerram-se automaticamente (art. 16º, nºs 4 e 5 da Lei nº 8/2018).

  1. Como se processa o encerramento do processo?

O encerramento do processo está sujeito a registo na CRC, com a menção da respetiva causa, e a publicidade, conforme regras legais e regras acordadas entre as partes (art. 17º, da Lei nº 8/2018).

  1. Sendo o acordo de restruturação fixado livremente entre as partes há regras a observar?

Sim. Há regras de conteúdo (art. 19º), forma (art. 20º) e disposições quanto à confidencialidade e depósito na CRC (artigos 21º e 22º, todos da Lei nº 8/2018).

  1. Quais os efeitos do acordo de reestruturação?

O acordo de reestruturação produz efeitos a partir da data de depósito na CRC, salvo disposição em contrário do próprio acordo e apenas para o futuro. Os efeitos podem incidir sobre garantias preexistentes, novas garantias, processos judiciais em curso, reestruturação societária, efeitos fiscais, resolução de negócios em benefício da massa insolvente e de articulação com o PER (artigos 23 a 29º, da Lei nº 8/2018).

27.1. Efeitos do acordo no âmbito de processos judiciais em curso:

A eventual extinção de processos judiciais em curso aplica-se, exclusivamente, a processos interpostos pelos credores subscritores do acordo. Não se aplica a processos judiciais de natureza laboral, declarativos, executivos ou cautelares e a credores que não são parte no acordo de reestruturação (art. 25º, nºs 1, 2 e 3, da Lei nº 8/2018).

27.2. Efeitos do acordo no âmbito fiscal:

As partes podem beneficiar do disposto nos artigos 268º a 270º do CIRE, desde que o acordo de restruturação contemple, pelo menos, a reestruturação de créditos que representem 30% do total do passivo não subordinado do devedor. Para estes efeitos, o acordo de reestruturação deverá ser acompanhado de declaração emitida por ROC a certificar a satisfação do requisito antes referido, a certificar que a situação da empresa fica mais equilibrada por aumento do rácio ativo/passivo e a certificar que os capitais próprios da empresa devedora são superiores ao capital social. Outras situações poderão gozar de benefícios, atentos os trâmites regulamentares e a anuência da AT (art. 27º, da Lei nº 8/2018).

27.3. Efeitos do acordo no âmbito da resolução de negócios em benefício da massa insolvente:

Caso o devedor venha a ser declarado insolvente, são insuscetíveis de resolução em favor da massa insolvente, os negócios jurídicos que hajam aportado a disponibilização ao devedor de novos créditos pecuniários e desde que estes negócios estejam expressamente previstos no acordo de reestruturação ou no protocolo de negociação, exceto se os novos créditos foram utilizados pelo devedor para pagar ao financiador ou parte relacionada (art. 28º, da Lei nº 8/2018).

27.4. Efeitos do acordo no âmbito da articulação com o PER:

Se o acordo de reestruturação for subscrito por credores que representem as maiorias previstas no nº 1 do art. 17º-I do CIRE, ou a ele vierem posteriormente a aderir credores suficientes para perfazer a maioria, pode o devedor iniciar um PER com vista à homologação judicial do acordo de reestruturação, devendo nesse caso acautelar que este cumpre o previsto no nº 4 do art. 17º-I do CIRE (art. 29º, da Lei nº 8/2018).

  1. Quais são os efeitos do incumprimento do acordo de reestruturação?

O incumprimento de alguma das obrigações previstas no acordo reestruturação não determina a invalidade das demais obrigações, nem afeta a validade dos atos que hajam sido praticados na sua execução, designadamente os atos societários. Salvo disposição em contrário do acordo de reestruturação:

  • o incumprimento por uma das partes legitima a parte afetada a resolver o acordo;
  • o incumprimento de uma prestação legitima o credor a declarar vencidas todas as demais de que seja credor, constantes do acordo;
  • o incumprimento perante um credor não determina automaticamente o incumprimento das demais obrigações constantes do acordo.

A resolução do acordo não tem efeitos retroativos. O acordo constitui título executivo relativamente às obrigações pecuniárias nele assumidas (art. 30º, da Lei nº 8/2018).

  1. Para além dos benefícios fiscais há outras isenções ou benefícios?

Sim. Os atos praticados junto da CRC gozam do benefício previsto no nº 18 do art. 28º do RERN, segundo o qual:  “Estão isentos de tributação emolumentar os atos notariais e de registo exigidos para execução de providências integradoras ou decorrentes de plano de insolvência judicialmente homologado que visem o saneamento da empresa, através da recuperação do seu titular ou da sua transmissão, total ou parcial, a outra ou outras entidades” (art. 34º da Lei nº 8/2018).

  1. Quais os efeitos do acordo, na esfera dos credores, resultantes do não pagamento definitivos de créditos?

Caso resulte do acordo de reestruturação o não pagamento definitivo de créditos, quando for celebrado e depositado na CRC, acompanhado da certificação específica por ROC, conforme o nº3 do art. 27º, da Lei nº 8/2018, os créditos perdoados poderão ser regularizados em termos de IRC e IVA, atentas a sua especificidade e enquadramento nos artigos 41º e 78º-A do CIRC e CIVA, respetivamente.

  1. Pode um devedor recorrer a novas negociações no RERE?

Sim, mas não pode sujeitar ao RERE mais de que um processo em simultâneo. Contudo, após a conclusão das negociações, com ou sem acordo de reestruturação, é livre de recorrer novamente ao RERE, desde que não viole os termos específicos de acordo anteriormente alcançado, ao abrigo deste regime (art. 18º, da Lei nº 8/2018).

 

Em suma, estamos perante um regime confidencial, o que será, manifestamente, uma vantagem para evitar a morte civil e prematura da empresa em situação económica difícil ou em insolvência eminente, que poderia advir do impacto estigmatizante da publicidade de um processo de recuperação, retraindo, muitas vezes, os agentes económicos e, consequentemente, reduzindo o valor da empresa no mercado.

Um estudo realizado pela Comissão Europeia, em 2014, – Study on a new approach to business failure and insolvency – Comparative legal analysis of the Member States’ relevant provisions and practices –, comprovou que as empresas em dificuldades só muito tardiamente recorrem a este tipo de regimes, colocando em causa o seu sucesso.

Por esse motivo, é importante entender que conjugar o RERE com a mediação, em tempo útil, poderá ser um fator relevante, determinante e eficaz na recuperação das empresas.

 

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