PARI e PERSI: Mecanismos de protecção dos devedores em situação de incumprimento de contratos de crédito bancário
O DL n.º 227/2012, de 25 de outubro, na tentativa de fazer face ao elevado número de casos de incumprimento de contratos de crédito bancário, veio criar novas obrigações a cargos das instituições de crédito.
- PARI e PERSI: o que são e quais são os objetivos?
As instituições de crédito estão obrigadas a instituir medidas que visam evitar o incumprimento, bem como procedimentos que impulsionem a regularização das situações de incumprimento daqueles contratos.
Acessoriamente a lei atribui aos consumidores direitos de informação, aconselhamento e acompanhamento, bem como a exigência da implementação de procedimentos de recolha, tratamento, análise e registo de informações dos clientes e, ainda, a devida formação dos trabalhadores a quem sejam atribuídas tarefas no âmbito do PARI e PERSI.
É nesta senda que surgem o Plano de Ação para o Risco de Incumprimento (PARI) e Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI).
- Como se relacionam?
Como o nome já sugere, o PARI cria mecanismos de prevenção do incumprimento, enquanto o PERSI trata já da gestão do já incumprimento. Este segundo é, na verdade, o procedimento aplicável quando de fato a obrigação já se encontra em mora.
- A quem é aplicável?
Os mecanismos PARI e PERSI são aplicáveis ás instituições de crédito e clientes bancários que tenham celebrado os seguintes contratos de crédito (nº1 do art.º 2):
- Contratos de crédito relativos a imóveis abrangidos pelo Decreto-Lei n.º 74-A/2017, de 23 de junho, na sua redação atual;
- Contratos de crédito aos consumidores abrangidos pelo disposto no Decreto-Lei n.º 133/2009, de 2 de junho, na sua redação atual;
- Contratos de crédito ao consumo celebrados ao abrigo do disposto no Decreto-Lei n.º 359/91, de 21 de setembro, na sua redação atual;
- Contratos de crédito sob a forma de facilidades de descoberto que estabeleçam a obrigação de reembolso do crédito no prazo de um mês.
Nota: Esta lei não prejudica o regime aplicável aos sistemas de apoio ao sobre-endividamento, instituído pela Portaria n.º 312/2009, de 30 de março, na sua redação atual (nº2 do art.º 2).
- Sobre o “PARI” – Plano de Ação para o Risco de Incumprimento
4.1 Ao que exatamente estão as entidades bancárias obrigadas?
As entidades obrigadas devem elaborar e executar (art.º 11):
- Os procedimentos adotados para o acompanhamento permanente e sistemático da execução dos contratos de crédito
- Os factos que indiciam degradação da capacidade financeira
- Os procedimentos a adotar pelos seus trabalhadores envolvidos no atendimento ao público
- Os procedimentos desenvolvidos para a recolha, tratamento, análise e registo da informação referente a clientes bancários que apresentem indícios de risco de incumprimento;
- o prazo para a realização do primeiro contacto após a deteção ou conhecimento dos indícios de degradação
- As soluções suscetíveis de serem propostas aos clientes bancários em risco de incumprimento
A lei dá entender que a forma de execução dessas obrigações está na liberdade de cada instituição de crédito, não obstante o Banco de Portugal tenha competência para, mediante aviso, definir os factos que indiciem degradação da capacidade financeira dos clientes e os procedimentos relevantes a serem adotados (nº4 do art.º 11)
A lei, no entanto, já estabelece que são indícios (nº4 do art.º 9):
- A existência de incumprimentos registados na Central de Responsabilidades de Crédito do Banco de Portugal
- A devolução e inibição do uso de cheques e correspondente inserção na lista de utilizadores de cheque que oferecem risco
- A existência de dívidas fiscais e à segurança social
- Insolvência
- Existência de processos judiciais e de situações litigiosas
- A penhora de contas bancárias
- Encontrar-se em situação de desemprego
- A perda de rendimentos ou a evolução desfavorável significativa do desempenho do setor de atividade económica em que o cliente bancário desenvolve a sua atividade profissional
- Verificação de incumprimentos noutros contratos celebrados com a instituição de crédito.
Atenção: Para o devido acompanhamento a instituição de crédito pode solicitar as informações e os documentos (estritamente) necessárias e adequados para a avaliação da capacidade financeira do cliente (nº3 do art.º 11º-A). O cliente bancário deve prestar a informação e disponibilizar os documentos solicitados pela instituição de crédito no prazo máximo de 10 dias, sob pena de não beneficiar de qualquer proposta para prevenção do cumprimento (nº4 do art.º 11º-B).
4.2 Como funciona na prática?
Quando se verifica que existe risco de incumprimento, mas que o cliente bancário ainda dispõe de capacidade financeira para cumprir as obrigações decorrentes do contrato de crédito, a instituição de crédito apresenta-lhe uma ou mais propostas que se revelem adequadas à sua situação financeira, objetivos e necessidades, que podem ser (nº1 e 2 do art.º 11-B):
- A celebração de um novo contrato de crédito tendo como finalidade o refinanciamento da dívida do contrato de crédito existente;
- A alteração de uma ou mais das seguintes condições do contrato de crédito, incluindo através:
- Do alargamento do prazo de amortização;
- Da fixação de um período de carência de reembolso do capital ou de reembolso do capital e de pagamento de juros;
- Do diferimento de parte do capital para uma prestação em data futura;
- Da redução da taxa de juro aplicável ao contrato durante um determinado período temporal;
- A consolidação de vários contratos de crédito.
A instituição de crédito acompanha a eficácia das soluções acordadas avaliando regularmente a adequação dessas soluções, podendo propor outras, se adequado (nº4 do art.º 11-B)
- Sobre o “PERSI” Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento
5.1 Como funciona?
No prazo máximo de 15 dias após o vencimento da obrigação, a instituição de crédito informa o cliente bancário do atraso no cumprimento e desenvolve diligências no sentido de apurar as razões subjacentes ao incumprimento (art.º 13).
Mantendo-se o incumprimento das obrigações o cliente é obrigatoriamente integrado no PERSI entre o 31.º dia e o 60.º dia subsequentes à data de vencimento (art.º 14). A integração do PERSI pode suscitar-se também por vontade própria do cliente. Se O cliente bancário houver anteriormente alertado para o risco de incumprimento a integração ao PERSI ocorre logo que a obrigação fica vencida.
Para elaboração de proposta de regularização do vencimento, tenta-se perceber a causa do incumprimento, estando as instituições bancárias habilitadas novamente a pedir informações e documentos aos clientes, que devem ser atendidas no prazo máximo de 10 dias, sob pena de não beneficiar de qualquer proposta (nº1, 2 e 3 do art.º 15).
No prazo máximo de 30 dias após a integração do cliente no PERSI, as entidades obrigadas devem elaborar proposta de regularização, salvo se se verificar que o cliente não dispõe de capacidade financeira para retomar o cumprimento (nº4 do art.º 15).
As propostas podem passar-se pelas mesmas soluções mencionadas quanto as propostas no âmbito do PARI, proposta esta que pode ser negociada entre as partes (art.º 16).
- Extinção do PERSI (art.º 17)
Extingue-se automaticamente:
- No 91.º dia subsequente à data de integração do cliente bancário neste procedimento, salvo se as partes acordarem, por escrito, na respetiva prorrogação; ou
- Com a declaração de insolvência do cliente bancário.
A instituição de crédito pode, por sua iniciativa, extinguir o PERSI sempre que:
- Seja realizada penhora ou decretado arresto a favor de terceiros sobre bens do devedor;
- Seja proferido despacho de nomeação de administrador judicial provisório;
- A instituição de crédito conclua que o cliente bancário não dispõe de capacidade financeira para regularizar a situação de incumprimento, designadamente pela existência de ações executivas ou processos de execução fiscal instaurados contra o cliente bancário que afetem comprovada e significativamente a sua capacidade financeira e tornem inexigível a manutenção do PERSI;
- O cliente bancário pratique atos suscetíveis de pôr em causa os direitos ou as garantias da instituição de crédito;
- O cliente bancário não colabore com a instituição de crédito, nomeadamente no que respeita à prestação de informações ou à disponibilização de documentos solicitados no prazo legal
- Vantagens da integração ao PERSI
No período compreendido entre a data de integração do cliente bancário no PERSI e a extinção deste procedimento, a instituição de crédito está impedida de:
- Resolver o contrato de crédito com fundamento em incumprimento;
- Intentar ações judiciais tendo em vista a satisfação do seu crédito;
- Intentar ações judiciais tendo em vista a satisfação do seu crédito;
- Transmitir a terceiro a sua posição contratual.
A instituição pode, no entanto:
- Fazer uso de procedimentos cautelares adequados a assegurar a efetividade do seu direito de crédito;
- Ceder créditos para efeitos de titularização; ou
- Ceder créditos ou transmitir a sua posição contratual a outra instituição de crédito.